Por Fausto Mussi – Prof Me área Performance Humana
“Sem música, a vida seria um erro” Friedrich Nietzsche.
É bem conhecida a influência da música no desempenho do exercício moderado e nos estados de ânimo. De acordo com a ciência, esse gesto pode ser muito benéfico para o corpo, porém pesquisadores alertam quanto ao uso desnecessário e excessivo.
Estudos mostram que uma trilha sonora durante o exercício físico faz toda a diferença no desempenho de um treino.
Existem estudos que comprovam que a música faz o corpo liberar endorfina e dopamina, hormônios que provocam a sensação de prazer. Isso associado à atividade física, potencializa a performance. Além, do fator estimulante, o simples fato de baixar uma nova playlist que irá acompanhar o treino já é motivador para a prática do exercício físico.
Um grupo de cientistas liderado por Peter Terry estudou o efeito da música sobre o rendimento durante a prática de exercícios na Universidade de Southern Queensland, na Austrália, em colaboração com o professor Costas Karageorghis e sua equipe que analisaram 139 estudos disponíveis sobre o tema.
Eles foram publicados entre 1911 e 2018, reunindo mais de um século de informação. O objetivo era fazer um resumo suficientemente completo e confiável dos benefícios da música.
Diminui a percepção de esforço
Um dos benefícios mais interessantes da música envolve o fato de que ela modifica a percepção do esforço que estamos realizando. Ou seja, nos ajuda a sentir que o exercício é menos difícil e árduo. Isso significa que diminui notavelmente a sensação de sacrifício ou sofrimento ao fazer atividade física.
Melhora a performance
Para a melhora da performance a música pode ser considerada um suplemento. Ela corresponde ao aumento espontâneo da produção no exercício. Ou seja, se normalmente você faz 40 flexões de braço, se estiver ouvindo música, vai conseguir fazer mais algumas com a mesma percepção de esforço.
Isso se aplica também aos exercícios repetitivos aeróbicos. O efeito ocorre quando a pessoa consegue sincronizar a atividade com o ritmo da melodia. Os pesquisadores destacaram que a música pode ser uma boa referência para manter um ritmo constante em exercícios como o afundo, por exemplo.
Melhora a capacidade fisiológica
Terry e Karageorghis consideraram que fazer exercício ouvindo música proporciona um aumento da capacidade fisiológica. Isso quer dizer que ocorre uma otimização do uso do oxigênio de que dispomos, devido a influência positiva da música no ritmo da frequência respiratória. Portanto, a atividade física aumenta o fluxo sanguíneo, mas reduz a quantidade de oxigênio necessário para corresponder a este aumento.
Tudo indica que o bom humor e a união do corpo com os diferentes ritmos faz com que a respiração se torne mais harmônica e, por isso, conseguimos melhorá-la.. Considera-se assim que a fadiga demore mais para chegar.
Efeitos cerebrais da música durante o exercício isométrico
Um estudo publicado no International Journal of Psychophysiology indica que ter uma trilha sonora durante o treino ajuda a ativar uma parte do cérebro responsável por retardar a sensação de fadiga causada pelo exercício isométrico
Marcelo Bigliassi, principal autor do estudo. Pesquisa original no link ⤵️
https://doi.org/10.1016/j.ijpsycho.2018.07.475
A pesquisa contou com a participação de um grupo de 19 adultos saudáveis que, durante dez minutos, realizaram trinta séries de exercícios cada um enquanto a atividade cerebral era monitorada. O estudo mostrou que, enquanto a música tocava, os participantes tinham pensamentos não relacionados ao exercício, os sinais referentes ao cansaço eram moderados e o próprio exercício se tornou mais agradável se comparado a uma condição sem música.
Outros estudos também já indicaram a influência de uma trilha sonora enquanto se treina. Uma pesquisa da Brunel University de Londres afirmou que a música melhora o desempenho do atleta em até 15%. Ainda outros afirmam que, enquanto um atleta treina ouvindo música o corpo libera uma quantidade menor de hormônios relacionados ao estresse e uma maior quantidade de hormônios de prazer, criando a sensação de que o tempo está passando mais rápido.
Investigações anteriores já haviam apontado outros benefícios da música, como ser excelente fator motivante, além de melhorar o humor das pessoas. No entanto, os pesquisadores da Brunel University London, na Inglaterra, responsáveis pelo estudo, advertem que os indivíduos não devem usar a estimulação sonora para enfrentar todas as tarefas cotidianas, pois a longo prazo isso pode prejudicar o funcionamento do corpo.
Conforme Marcelo Bigliassi, os efeitos da música no exercício vêm sendo investigados há mais de um século, embora ainda haja muita coisa que a ciência não foi capaz de desvendar.
Casuística
Para tentar entender melhor como essa relação música-treino pode melhorar o desempenho físico, a equipe recrutou dezenove participantes (sete mulheres e doze homens) sem histórico de doenças graves.
Durante dez minutos, cada participante realizou trinta séries de exercícios usando um anel de aperto para fortalecimento da mão; ao mesmo tempo, a atividade cerebral era monitorada por meio de um exame de ressonância magnética. Além disso, durante as séries, os cientistas tocaram I Heard It Through the Grapevine (1970), da banda de country rock americana Creedence Clearwater Revival.
Notou-se que, conforme a música tocava, ocorreram mudanças na atividade cerebral dos participantes: o contato com a música aumentou a frequência de pensamentos dissociativos (pensamentos não relacionados ao exercício), moderou os sinais relacionados à fadiga e tornou o exercício mais agradável do que sob condições de controle sem música.
Constatou-se também que o giro frontal inferior esquerdo – parte do cérebro que processa informações de fontes externas e internas – foi ativado em resposta à música. Os pesquisadores acreditam que isso tenha acontecido por essa região estar associada ao processamento emocional. Através da observação dessa área do cérebro, eles ainda descobriram que, quanto mais ativa ela ficava, menos sensação de cansaço os participantes pareciam sentir.
Diante dessas considerações, os pesquisadores esperam entender de que forma esse tipo de estimulação pode ajudar pessoas sedentárias, obesas ou com sobrepeso a não desistir dos programas de atividade física recomendados.
Música um refúgio
Conforme o autor, os seres humanos estão constantemente tentando se alienar/fugir da realidade e de todas as formas de desconforto físico ou dor, encontrando na música um refúgio.
No entanto, ainda que existam benefícios na manutenção de sua playlist predileta, ele alertou para o fato de que o uso constante e desnecessário da estimulação auditiva e visual pode reduzir a capacidade de processamento natural da fadiga. Por isto, o pesquisador adverte as pessoas, especialmente os mais jovens, permitam que o cérebro lide com as experiências ruins na ausência de música.
Enfim, é fato que a música exerce um efeito muito interessante em nosso cérebro. A novidade é que permite ver até que ponto ela pode nos ajudar a realizar atividades que, a princípio, seriam árduas para nós. Assim, a música se transforma em uma grande aliada para tirar o maior proveito possível dos exercícios físicos e uma aliada ao anti-sedentarismo,
Porém, como sempre, o bom senso, a moderação e o equilíbrio são fundamentais para o bem estar e uma vida com qualidade.
Capoeira e musicalidade
Ao se pensar em uma prática corporal genuinamente brasileira, a capoeira foi criada pelos escravos como forma de luta para se conquistar a liberdade. Apesar de ser uma prática corporal, hoje ela é considerada um misto de dança, jogo, luta, arte e folclore.
A capoeira tem como principal característica os movimentos corporais com ótima agilidade. Marcada pela musicalidade. Numa roda de capoeira, é a música que determina o andamento do jogo; ela é a que norteia o jogador para o que deve ser feito e quando ser feito. Conforme a música vai aumentando de ritmo, os golpes vão se tornando mais velozes.
A música era utilizada para enganar os opressores, que ao verem os escravos fazendo movimentos corporais ao som dos instrumentos entendiam que aquele ritual era uma dança e não uma luta. Dessa maneira, a capoeira passou muitas vezes despercebida, possibilitando a sua prática entre os negros.
Uma característica que distingue a capoeira de outras lutas é o fato de a mesma ser acompanhada por música. É a música que decide o ritmo e o estilo do jogo, que é praticado no decorrer da roda de capoeira, um círculo de pessoas onde ela é jogada.
“Na capoeira ninguém, é igual, também ninguém é diferente e sim únicos, assim como na vida”
mestre Val Boa Morte
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